segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Este é para ti, Tânia

Não me conheces. E eu nunca te vi. E tenho dúvidas se quero que isso mude. Soube da tua existência através da assinatura que deixaste na parte de trás de uma cadeira num avião da TAP. Não sei que motivo te levou a julgar que alguém poderia estar interessado em saber que tinhas passado por ali. Eu não estava. Tenho perguntado a algumas pessoas que conheço e a resposta tem sido unânime, vê lá tu. Mas, seja esse motivo qual for, pensa duas vezes da próxima vez. É que, sabes, há alguma poesia em quem perde tempo a escrever versos de pé quebrado de calças pelos tornozelos na porta de uma casa de banho ou em quem grafita bonecos inenarráveis em paredes recém-pintadas. Ambos implicam risco, alguma coragem física e certo amor à arte. Contigo não, Tânia. Não foste mais criativa que quem toca a uma campainha. Achaste que devias escrever o teu nome nas costas de uma cadeira. Aproveitaste a passividade cúmplice dos teus vizinhos mais próximos e a distracção da tripulação - eventualmente entretida com o mantra café-coffee-tea-chá - para sujar simplesmente o assento à tua frente. E pronto. O cinzento-murídeo da coisa, já de si tão apelativo como uma bota da tropa, ficou marcado pela tua esferográfica azul e pelos contornos arrebicados do teu nome. Como te dirá qualquer Fátima Lopes desta vida, a opção por semelhante combinação cromática no mobiliário de voo é esteticamente lamentável. Tristonha, bisonha, mortiça. Mas esquece o cromatismo Podias, pelo menos, ter escrito qualquer coisa com interesse. Já que estavas a sujar o que não é teu - ou é só um bocadinho - que aproveitasses para cunhar uma obra para a posteridade. Que valesse a pena, que desse nas vistas, que ficasse para sempre nos anais da intervenção artística aeronáutica. Mas nem uma data, nem um pensamento, nem uma garatuja, sequer. Nada. Da próxima vez puxa pela imaginação. Tenho a certeza que és capaz de melhor. Desculpa, Tânia, mas só "Tânia" é muito pouco.