terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Cavaquices e lealdades institucionais

Começo por uma declaração de interesses. Não votei no Prof. Cavaco para presidente da república e continuo a achar que um (eventualmente) bom primeiro ministro não é (necessariamente) um bom chefe de Estado. E em meu entender o Prof. Cavaco não é um bom chefe de Estado. Faz-me confusão que o chefe de Estado não saiba História, por exemplo. Mas isso sou eu, que cultivo interesses revestidos de total irrelevância, pelo simples prazer que me dão. Onanismos intelectuais, portanto, que pouco ou nada interessam à república. Mas entristece-me ver o Estado chefiado por uma espécie de manequim de uma montra da Rua dos Fanqueiros. Com coluna indiscutivelmente direita, de antes quebrar que torcer, mas pouco mais do que isso. O Dr. Soares, um "pilantra político", tinha, apesar dos muitos pesares, outra dimensão. Outra cultura. E o hábito de não gostar particularmente de números. E o de não saber fazer contas. Como, aliás, o Eng. Guterres. Também por isso, ambos foram péssimos chefes de governo, ainda que tivessem perfil para a chefia do Estado.
O Prof. Cavaco tem imprimido à presidência um estilo que reputo de lamentável. Não tanto pelos pertinentes vetos mas por um punhado de inusitadas promulgações, algumas condicionais ou com reservas. Acho deplorável que o presidente aponha a sua assinatura num diploma, fazendo-o acompanhar de uma notinha explicativa da sua oposição. A oposição política aos projectos ou propostas legislativas chama-se veto político. E o presidente pode vetar politicamente, no uso das suas prerrogativas constitucionais. E pode enviar os diplomas para o Tribunal Constitucional se tiver dúvidas sobre a sua conformidade com a Lei Fundamental. É o que se chama veto jurídico.
Admito que o presidente queira fazer, e que faça, uso parcimonioso do direito de veto, por não ser ele o condutor dos negócios do Estado. Mas se entende não vetar, política ou juridicamente, um determinado diploma, que ladre no recato dos contactos que deve manter com o legislador, mas que se cale publicamente. Fazendo o contrário, mostra uma censurável falta de lealdade institucional. A primeira deslealdade teve um dono. E não foi o Sr. Pinto de Sousa.
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Nota de actualização: foi removida uma gralha para a qual leitor atento me chamou a atenção.