sábado, 1 de novembro de 2008

Os mata-frades do século XXI

O mundo vive mergulhado no relativismo. Perdendo-se os referentes do Bem, da Verdade e do Absoluto, tudo passa a ser permitido e qualquer opinião é – e tem de ser – aceite como válida. Não importa se contende com princípios éticos e axiológicos, mesmo que – e dizemo-lo para afastar elementos perturbadores do discurso – não religiosos, porque a instância máxima de legitimação passa a ser a vontade, insindicável, totalitária, despótica, do eu solitário, solipsista, egoísta, orientado pelo hedonismo e pelo imediatismo. O que dá prazer, o que contenta momentaneamente, o que potencia a euforia desbragada é o que é assumido como fim da existência. E o indivíduo perdido em si mesmo, assumindo-se como rei absoluto da sua vida, tem direito a dizer o que quer e quando quer. O inalienável direito à opinião, pública, publicada ou privada, que não admite o erro ou o contraditório. Se outros aduzem argumentos contrários, são de pronto reduzidos à sua insignificância, pelo disparo de “isso é relativo”, quando não desmerecidos pela acusação dos pressupostos de que partem.
A absoluta liberdade de expressão já não encontra, como para os liberais, limite na liberdade do outro, mas na sacralização do politicamente correcto. E este é, no momento histórico actual, incompatível com a religião. Ou alguma religião. Daí que sejam elevadas a formas de arte ou expressões legítimas da liberdade de pensamento ataques ao sentimento religioso de cada um e da comunidade como um todo.
Todos se podem queixar. Mas não um católico. Um católico que se queixe é um católico cristiovitimizado e isso, seja lá o que isso for, porque de facto não corresponde aos dados históricos e sociais, é mau. Um católico que manifeste a sua posição não é um sujeito no exercício da liberdade que todos reclamam; é um instrumento manietado pelos malfeitores todo-poderosos que procuram perpetuar as trevas no mundo, um acéfalo controlado pelo Papa. Nunca, por certo, lhes passou pela cabeça que as pessoas possam experimentar a fé como sentimento de união a Deus, nem jamais terão pensado que talvez seja um bocadinho presunçoso desqualificar a forma de vida que os outros escolheram viver. Ou mesmo um pouco contraditória essa obsessão descristianizadora com o fundamento hiperindividualista de que partem.
Mas não. Dizem que não. Não os preocupam “as bananas das religiões” se postas no seu lugar, se remetidas ao silêncio, se entrincheiradas no reduto do lar. O problema é que, para além de denunciarem que há umas pessoas que fazem do ataque à Igreja o motivo da sua existência, os católicos e a Igreja ousam querer ser escutados sobre temas importantes para o mundo. E isso é inadmissível. Mesmo que a Igreja seja uma pessoa jurídica. Mesmo que a Igreja seja, enquanto tal, portadora de direitos e deveres. Mesmo que a Igreja tenha, nesse contexto, um relevantíssimo papel assistencial, sem o qual o próprio Estado colapsava. Porquê? Porque a Igreja afirma o Bem e isso contende com o sacrossanto relativismo, porque ele é, afinal, a revelação de uma ética – desvaliosa, é certo –, que de neutral nada tem, por ser essa neutralidade a positiva assunção de um qualquer valor.
Combatem a Igreja em nome de um pluralismo radical de que se dizem arautos e o mesmo vem, paradoxalmente, a traduzir-se num dogmatismo de convicção de sentido contrário que, distante da tolerância cristã, resvala facilmente para o fundamentalismo.

4 comentários:

Freddy disse...

"Perdoa-lhes que eles não sabem o que fazem..."

José Luís Malaquias disse...

«Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de Mim. Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois assim perseguiram os profetas que vieram antes de vós.»
Sermão da Montanha, Evangelho Segundo São Mateus

Eu serei um daqueles que defende o relativismo que a Mafalda condene. E não o faço por subscrever as opções de abortacionistas e hedonistas, que me causam a mesma repulsa pessoal do que à Mafalda. Defendo-o porque a alternativa - a de encontrar um juíz terreno que decida quais são os padrões morais absolutos, que não se podem pôr em causa - historicamente, degenerou sempre em desgraça e abuso de poder.
Acredito numa espécie de Selecção Natural Darwinista aplicada às escolhas culturais das sociedades. Acredito que as sociedades que não preservam valores como a família e a vida, condenam-se à sua própria extinção cultural. Isso já é visível com a baixa natalidade da Europa não cristã, com um aumento demográfico em populações (nomeadamente cristãs) que dão prioridade à vida.
Por isso, o relativismo não me assusta. Acredito no sistema que o Deus Criador (ou o Grande Arquitecto, para quem preferir) nos deixou e acredito que, na grande ordem das coisas, a Verdade vem sempre ao de cima.
Para quem, como a Mafalda, tem de sofrer as injustiças e as perseguições que ela sente, até a verdade histórica lhe acabar por dar razão, pode sempre encontrar consolo na leitura das Bem-Aventuranças.

disse...

Mais do que as palavras, há que mostrar aos outros (que quase nos odeiam), a nossa vida de crentes.
Não moramos em casas diferentes, não comemos comidas diferentes, não vestimos roupas diferentes, apenas acreditamos em Deus que nos ama e que dá sentido à nossa vida.
Se exprimentamos este amor, nunca poderemos ter em nós o ódio, destes que acham que tem a verdade suprema de tudo, não ouvindo nada que lhes seja contrário.
Verdadeiros fundamentalistas são eles e nunca nós!

Mafalda disse...

Caro Zé Luís,

gosto de o "ver" por aqui, mas vou responder-lhe mais tarde, porque a gripe que me acompanha desde hoje de manhã não me permite articular mais do que uma frase.
Um beijinho.

Caro Tó,

tem toda a razão quando fala nessa experiência de Amor. Volte sempre.